1.16.2009

Contraste

parte I: real

A frase ainda ecoava na minha cabeça enquanto ela parecia despreocupada, protegida pelos óculos escuros. 

"Você deveriam ficar de vez em quando" foi seguido por um silêncio com gosto de protetor solar e sal. O sol ofuscava minha visão e eu fingi não ouvir, distraído com a revista. Estava contente por mais alguém pensar que nós deveríamos ficar juntos, mas ultrajado por ser 'de vez em quando'. Ninguém entendia quão maniaco aquele garoto encabulado era. Ele a queria para sempre. Só para ele. (Mesmo sabendo que se a tivesse, não estaria satisfeito. Talvez só obtivesse a felicidade plena quando a fatiasse para guardar os pedaços do corpo mutilado em um vidro e a cabeça na estante. O coração seria engolido cru e a seco, para saciar o aperto que ele sentia ao vê-la.) 

Ela manteve-se neutra, olhando os turistas vermelhos segurando suas crianças pelas mãos, esperando pelo surfistinha que tinha conhecido algumas horas antes, na água.

Ela sabia que ele a amava e gostava dessa sensação. Quem sabe em algum momento, em um futuro distânte, eles morariam juntos. Um dia, quem sabe. Não hoje. Hoje ela queria saciar-se com um surfistinha argentino qualquer.

parte II: alucinações de sonho.

A lua se refletia nas ondas enquanto eles ainda estavam sentados - dessa vez sozinhos - na areia. O branco pálido que antes tomava o corpo dos dois transformou-se em um vermelho que exalava amor de verão. 

Ela, distraidamente, brincando com os pés nos grãos gelados, pensava em tudo e em nada. 

Ele, no tom certo, cantarolava os versos que traduziam o que ele sentia, mesmo que em uma ínfima escala. Os mesmos versos que ela um dia dedicou a outro qualquer. Talvez cantava simplesmente por gostar de sentir o contraste do sangue quente se chocando com a brisa da madrugada. 

"My hopes are so high, that your kiss might kill me.
So won't you kill me, so I die happy.” 

Ela parou e tentou distinguir os sussurros. Reconheceu o tom e a melodia, se recordando de uma festa qualquer, com um cara qualquer, dançando. O mesmo cara que, alguns dias depois, mentiu infantilmente. Como todos os outros canalhas que ela havia se 'apaixonado'. 

“My heart is yours”

Ela já entregara o coração a tantos canalhas que não mereciam que não sabia mais o que fazer. Simplesmente não fazia nada, fingindo gostar de caras novos e vazios.

Ela ainda era segura, mas agora estava perdida. Seguramente perdida.

 "to fill or burst, to break or bury,"

Ele havia destroçado seu coração mais vezes do que gostaria de lembrar, mesmo sabendo que sem isso ele não era nada. Ele foi criado para sofrer e amar. Um grande perdedor. 

or wear as jewelery

Ele olhou para ela e reparou como sua pele recém bronzeada ficava prateada ao luar. Sabia que ela era a menina mais linda e que nunca encontraria alguém como ela, mesmo que fingisse muito bem. Ela era seu templo de inocência e beleza. Ou seja: tudo que ele procurava. 

parte III: descartável

"which ever you prefer.

Ele queria que aquele fosse o seu "Hands Down", mas não teve coragem de criar palavras para ilustrar seus sentimentos. Seria ridiculo, um xaveco barato. Quebraria o templo, violaria sua deusa. E ele era fiel ao seu coração partido. 

Um dia, quem sabe.

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